sexta-feira, 19 de julho de 2013

CAETANO VELOSO: “O Festival de Inverno é famoso em todo o Brasil”



Filho da Bahia, mais exatamente de Santo Amaro da Purificação. Cidadão do mundo, ou melhor falando, cidadão pernambucano, desde 2003. Caetano Veloso, como bem disse certa vez, “entrou e saiu de todas as estruturas”, flertou com quase todas as possibilidades de reinvenção estética em seu trabalho, consolidado ao longo de mais de quatro décadas, desde que tomou o Brasil de assalto com a explosão tropicalista, influenciando gerações a fio.
 
Hoje, aos 70 (quase 71) anos de idade, ele soa cada vez mais jovem, moderno e musicalmente ousado. Com “Abraçaço”, seu mais recente álbum, chega ao terceiro disco de uma trilogia – iniciada com “Cê” (2006) e seguida por “Ziie e zie” (2009) – concebida junto com a bandaCê, que traz à tona uma verve mais roqueira para vestir suas canções. Com exclusividade, o artista concedeu entrevista (via e-mail) ao site do FIG 2013 e falou sobre o show que apresenta no festival, próximo dia 20 de julho, no Palco Guadalajara. Além disso, falou da sua relação com Pernambuco, estreitada através do título de cidadão pernambucano, que recebeu há 10 anos, e do prazer em tocar e cantar pela primeira vez para Garanhuns.

#fig2013.com | Esta é a primeira vez que você vai se apresentar no Festival de Inverno de Garanhuns? Já esteve na cidade em alguma outra circunstância?
#caetano veloso | É a primeira vez que vou a Garanhuns, terra de Lula e de Arto & Duncan Lindsay.

#fig2013.com | O show que será apresentado no FIG é o “Abraçaço” e você seguirá fielmente o roteiro do que vem sendo apresentado? Ou você e a bandaCê estão preparando algo diferente?
#caetano veloso | Espero poder fazer alguma coisa em colaboração com Arto (Lindsay), afinal é a primeira vez que canto na terra brasileira dele. Em princípio, vamos levar o “Abraçaço” tal como ele é e tem sido apresentado pelo Brasil afora. Claro que com todas as variações que isso permite.

#fig2013.com | Gostaria de saber por quantas cidades a turnê do “Abraçaço” já terá passado até a data do FIG (20/7)?
#caetano veloso| Olha, me lembro de ter feito Rio, Fortaleza, São Paulo, Salvador, Recife, Porto Alegre, Belo Horizonte, Uberlândia, Goiânia, Campinas, Natal, Maceió… sei lá… Antes de Garanhuns ainda teremos, pelo menos, Curitiba e Novo Hamburgo.

#fig2013.com | Sendo sua primeira vez no FIG, é mais uma novidade em sua trajetória musical, que conta com mais de quatro décadas. Mesmo após tantos anos de carreira e experiência, esse sabor da novidade, de tocar pela primeira vez em algum lugar, ainda te gera alguma expectativa ou você já se acostumou a isso?
#caetano veloso| Fico feliz por ter sido convidado para cantar nessa cidade de que tanto ouço falar. O Festival de Inverno é famoso em todo o Brasil. As pessoas ficam surpresas ao saber que faz frio em Pernambuco. Para mim, cantar num lugar novo – sobretudo numa situação especial como é o festival – é sempre uma excitação diferente. A gente não se habitua a fazer show ao ponto de ficar frio com coisas assim.

#fig2013.com | O “Abraçaço” representa o terceiro disco de uma trilogia arquitetada junto à bandaCê, com uma sonoridade que evidencia uma roupagem mais “rock” às suas canções. O que este disco traz como diferencial em relação aos outros dois anteriores, em termos de sonoridade e conceito?
#caetano veloso| A concepção sonora foi semelhante à de “Zii e zie”: já temos uma banda que tem som próprio e eu imaginei canções para serem tratadas com esse som. O “Cê” foi diferente: inaugural, foi a captação de uma banda criada para tocar um repertório (e um estilo de arranjo) que tinha sido criado antes de sua existência. Coisas como “Funk melódico” vêm um pouco da experiência do “Recanto”, disco que criei para a voz de Gal. Mas também do meu interesse pelo funk carioca, uma forma popular muito naturalmente sofisticada.

#fig2013.com | Esses últimos trabalhos reiteram o que você vem demonstrando ao longo de todos esses anos de trajetória: um artista sempre aberto e conectado às novidades e a incorporar as novas expressões da música pop em sua música, sem preconceitos. Você acha que é esse aspecto que tem feito com que o público jovem se interesse cada vez mais pelo seu trabalho?
#caetano veloso| Ninguém sabe por que alguns artistas mantêm o interesse de sucessivas gerações. Mas isso não é incomum. Há casos como Neil Young ou Lou Reed, para não falar em Frank Sinatra ou Roberto Carlos. Meu interesse pelo rock vem do tempo do tropicalismo e nunca esmoreceu. Não sou nem nunca fui rockeiro. Nem desejei ser. Mas sempre quis pôr em meu trabalho o que percebi de importante nessa virada na música popular que o rock representou desde os anos 1950 e, mais ainda, a partir dos anos 1960. Mas o fato é que na minha geração vários artistas se mantêm interessantes. Os shows de Chico Buarque, Paul McCartney, Ozzy Osborne ou Rolling Stones têm mais público do que os meus. De todo modo, o público jovem consome mesmo mais discos e shows de música popular do que as pessoas mais velhas.

#fig2013.com | Quais as principais relações que você percebe entre seus últimos álbuns (em especial o “Abraçaço”) e os discos que também vêm sendo descobertos e aclamados pelo público mais jovem, como o “Transa”, por exemplo?
#caetano veloso| Sempre achei o trabalho com a bandaCê parente do trabalho do “Transa”: uma banda pequena partindo de ideias de arranjos que já nasciam junto com as composições. Sempre gostei especialmente de “Transa”. E tanto no show de “Cê” quanto no de “Zii e zie” e no de “Abraçaço” botei canções do “Transa”.

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#fig2013.com | Em 2013, completam 10 anos que você recebeu o título de cidadão pernambucano. Como é ser um “PEBA” (de PE + BA)*?
#caetano veloso| Sinto orgulho desse título. Gosto da seriedade pernambucana, do senso pernambucano de responsabilidade cultural. A Bahia precisa fazer muito esforço agora para recuperar sua identidade. Amo ser baiano e pernambucano.

#fig2013.com |E como a cultura (em especial a música) pernambucana te influencia no teu trabalho, na tua concepção artística?
#caetano veloso| Aos 8 anos de idade, eu era fã de Luiz Gonzaga. Hoje sou fã de “O som ao redor” [filme do cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho]. Entre os dois há todo um mundo de coisas.

#fig2013.com | O que você tem ouvido (e apreciado) de música pernambucana mais atual?
#caetano veloso| Estou ainda na Nação Zumbi e no DJ Dolores. Mas conheço Karina Buhr. E é claro que adoro Lenine.

#fig2013.com | Já tem ideias para um próximo disco? Ou ainda é muito cedo para dizer?
#caetano veloso| Ainda é muito cedo.

*Expressão, segundo Gilberto Gil, criada pelo pernambucano Jomard Muniz de Britto para “significar essas pontes importantes que unem a Bahia a Pernambuco”.( Por Leonardo Vila Nova/Fundarpe)